Falar em público é uma dificuldade que afeta a maioria das pessoas. Conheça 15 formas de evitar deslizes na hora do discurso para se tornar um bom orador

O Rei Jorge VI tinha uma missão: precisava fazer um importante discurso para todo o Reino Unido no início da Segunda Guerra Mundial, e para isso tinha que ser confiante, falar bem e demonstrar segurança para toda a população, liderando a nação pela guerra através de sua voz no rádio. Mas era gago. A gaguice e a paralisação frente ao microfone eram resultado de inseguranças, traumas e uma série de fatores que foram sendo superados um a um com a ajuda do fonoaudiólogo Lionel Logue através de técnicas de oratória. A história retratada no filme O Discurso do Rei, de 2010, rendeu à produção sete prêmios da British Academy of Film and Television Arts (BAFTA) e quatro Oscars em categorias importantes.

O problema que acomete até mesmo reis é tido por diversas pesquisas como um dos maiores medos da humanidade, para muitas pessoas superando o temor da morte: falar em público. No entanto, ao contrário da morte, especialistas garantem que é possível driblar essa fobia e encarar a plateia. Essa superação, ao contrário do que comumente se acredita, não é um dom, mas uma série de técnicas apuradas e repetidas exaustivamente. Ser um bom orador, afinal, está ao alcance de todos. Mas mais do que lições e passos a seguir para fazer um bom discurso, é importante saber o que evitar.

– Tão importante quanto saber aquilo que deve ser feito é saber aquilo que deve ser evitado, porque normalmente quando evitamos determinados comportamentos e atitudes, a chance de acertar é muito forte – afirma Reinaldo Polito, mestre em Ciências da Comunicação e professor de Oratória. Para aumentar suas chances de acertar, portanto, reunimos aqui algumas dicas de especialistas sobre o que fazer para não errar.

  1. Tensão

A fonoaudióloga Laila Wajntraub, professora de oratória e proprietária do Clube da Fala, garante que o primeiro passo para não deslizar ao falar em público é ficar tranquilo. A tensão, em geral, desencadeia todos os outros problemas dessa lista, como falha na voz, falta de postura, tiques e manias, falta de coesão etc.

– Temos na escola ótimos profissionais, pessoas com mestrado e doutorado no exterior, mas que, na hora de falar, não conseguem passar credibilidade porque ficam muito tensos.

  1. Despreparo

Não estar bem preparado, ou seja, não ter planejamento, é quase uma garantia de que algo sairá errado na apresentação. Osório Antonio Cândido da Silva, professor especialista em Técnicas de Comunicação e Expressão Verbal há mais de 30 anos e mestre em Ciências da Comunicação, sugere que a pessoa faça uma lista de tudo o que pretende falar, e crie um roteiro para isso seguindo uma lógica simples e de fácil compreensão. Caso contrário, correr o risco de não ser entendido pelo público.

– Treine e siga seu roteiro. Por exemplo: apresente um cenário instigante, proponha uma solução para o caso, construa a sua argumentação em cima disso e finalize com uma proposta de ação – ensina Osório. – Se houver slides para apoiar a apresentação, todos deverão seguir a lógica da fala, o que quer dizer, deverão estar conectados com o espírito do discurso.

Lembre-se também de sincronizar a fala planejada com o tempo disponível. Exercitar a apresentação antes diminui também o risco de imprevistos.

– Apresente-se para sua namorada, seu esposo, seu filho, seu amigo antes do discurso, para treinar. Assim, você vai estar muito melhor preparado. Isso é fundamental, simples e muitas pessoas ignoram – descreve Sandro Huguenin, sócio do Clube da Fala.

  1. Não ir direto ao assunto

Deixar de falar logo de cara quem você é e do que vai falar pode causar confusão no entendimento da mensagem ou, por outro lado, perder a atenção do público. Se uma consultoria prestar serviço para uma empresa, por exemplo – cita Polito –, irá fazer levantamento de problemas que, muitas vezes, os próprios executivos desconhecem. Caso apresente soluções a essas questões antes de oferecer um diagnóstico, os funcionários não vão entender o que a consultoria está falando.

  1. Discurso descontextualizado

Polito alerta que também é desaconselhável falar de uma novidade ou um problema novo sem inseri-lo em um contexto ou histórico.

– Um grande número de pessoas pode estar sabendo do que você está falando, mas a parte do grupo que não tem essa informação fica de fora. Se você falar pressupondo que todo mundo conheça a informação, uma parte do grupo nao vai entender. Por outro lado, sevc falar como a informação fosse desconhecida, enfraquece seu discurso, porque muitos já sabem – problematiza o professor.

Uma sugestão, neste caso, é explicar rapidamente esse contexto, usando frases como: “Como é do conhecimento de todos”, “como a maioria já sabe”, “vou repetir algumas informações para alinhar o tema”.

  1. Ignorar o público-alvo

O maior erro ao se dirigir a uma plateia, segundo Polito, é falar como se todos os ouvintes fossem sempre iguais. A mensagem precisa ser pensada de acordo com o nível sociocultural das pessoas, a faixa etária média, a formação acadêmica, o conhecimento predominante do grupo (são especialistas ou leigos), entre outros.

– Se você se dirige a jovens, fala do futuro, do amanhã, de planos. Se começa a falar do passado, eles não têm a menor ligação com isso. Já um público de 60 anos, ao ouvir sobre futuro, se pergunta: que futuro? Ele vai se preocupar mais com que realizou, o que fez.

O recurso de contar histórias para envolver o público, muito utilizado em palestras, também pode ser um tiro na água com a plateia errada. Ainda que entendam que o exemplo é ilustrativo para o conteúdo, pessoas atarefadas e objetivas são impacientes e sentem que estão perdendo tempo com esse tipo de recurso.

  1. Vocabulário de escanteio

Segundo Laila, há três tipos de vocabulário usados em um discurso: o técnico/profissional (de determinada área, como do jornalismo, do direito etc.), o coloquial e o formal. Ela defende que cada vez mais oradores têm lançado mão da linguagem informal para se comunicar na maior parte das apresentações, pois ela é mais natural. O vocabulário técnico é compreendido por apenas um determinado grupo, e corre-se o risco de falar em códigos, tornando a mensagem incompreensível. O discurso formal é extremamente artificial, e distancia o palestrante do seu público. Ao mesmo tempo, atente para as pessoas presentes na plateia para escolher palavras que todos assimilem.

– Prepare-se bem para não depender de um vocabulário pobre e vulgar; desenvolva um vocabulário simples, objetivo e suficiente para expor todas as suas ideias. Ler muito os bons autores é uma excelente forma de aprender – tanto gramática quanto vocabulário – alerta o professor Osório.

Henry Leyraud, docente da área de Administração e Negócios do Senac Itaquera, lembra de eliminar ao máximo tiques e vícios de linguagem, como “ah”, “né”, “então”, entre outros.

– Isso fica muito repetitivo e chato – diz.

  1. Subestimar o poder da voz

– Uma fala desarticulada e uma dicção sofrível desmancham qualquer encanto que um orador poderia apresentar – afirma Osório.

O professor sugere que o orador faça exercícios para aprimorar a qualidade da fala, desenvolver uma boa dicção e refinar a pronúncia das palavras, como um trabalho de entonação da voz, de intensidade (volume), velocidade e ritmo.

Laila, do Clube da Fala, afirma ainda que trabalhar a voz é uma forma de imprimir mais assertividade. Impostar e projetar a voz, coordená-la com a respiração e saber colocar entonação na fala são habilidades que só dependem de treinamento.

– A voz é o principal instrumento em uma comunicação, é como um instrumento musical. Quando tocamos um violino, por exemplo, é fundamental que ele esteja bem afinado. Assim você vai ter mais segurança para tocá-lo – observa Sandro.

  1. Desdenhar da expressão corporal

Albert Mehrabian, pesquisador da Universidade de Harvard, detectou que os ouvintes dividem sua atenção ao orador em 7 % à palavra, 38 % à voz e 55 % à expressão corporal. O corpo precisa acompanhar harmoniosamente o discurso. Gesticular em excesso, demonstrar insegurança, agitação, desviar de olhar, ficar de braços cruzados, mexer no cabelo constantemente e outras expressões da linguagem corporal acabam agindo contra o orador.

– É preciso tomar cuidado com alguns gestos excessivos que podem demonstrar nervosismo, mas, ao mesmo tempo, a falta de gestos pode passar apatia – pondera Henry.

Osório sugere que o orador busque desenvolver uma dinâmica corporal própria, gesticulando com moderação e de forma coerente com o que está sendo dito.