Tendência de formação de tecnólogos têm crescido por causa de vantagens no tempo de curso, na especialização oferecida na carreira e no foco na prática e no mercado de trabalho

Quando Letícia Fiaschi ingressou em uma graduação em tecnologia aos 17 anos, tinha muitas dúvidas. Não sabia exatamente a profissão que queria seguir, e não queria arriscar um curso de quatro anos do qual poderia se arrepender depois. O que começou como um teste, no entanto, logo se tornou uma decisão da qual a jovem se orgulha atualmente, depois de formada e inserida no mercado de trabalho. “Hoje vejo que fiz a escolha certa, e não sinto falta de uma formação como bacharel”, analisa. “O curso tecnológico foi bem completo para mim, e vejo que, comparando com pessoas que fizeram um curso de bacharel em Marketing, não ficou nada a desejar na minha formação.”

Letícia se formou como tecnóloga em Marketing pelo Centro Universitário Senac, em São Paulo, e garante que isso propulsionou sua carreira como não teria acontecido caso tivesse optado por uma graduação de quatro anos. Quando era estudante do ensino médio, trabalhava com seu pai, mas decidiu atuar profissionalmente em outro ramo. O curso fez com que conseguisse um emprego de recepcionista bilíngue em uma agência de publicidade e, assim que se formou, dois anos depois, foi efetivada e trabalha atualmente na área de atendimento da agência.

O que atraiu Letícia para uma formação como tecnóloga foram os três principais benefícios que esse tipo de graduação traz: a curta duração, que permite a inserção no mercado de trabalho mais cedo; o foco específico e a especialização dentro de uma área que admite amplas possibilidades de atuação; e a priorização da prática e da realidade do mercado em vez do aprofundamento em estudos teóricos.

Prática e mercado

Letícia considera ter chegado melhor preparada para atuar no mercado de trabalho após dois anos de curso do que ela observa em bacharéis com quatro anos de formação, mas que não têm uma visão tão pragmática da profissão sem ter tido experiência profissional anterior. “Sinto que tenho uma visão diferente, porque sei como aplicar no trabalho o que aprendi. Na hora da prática, podemos ver que a realidade é muito mais próxima da experiência vivida no curso em tecnologia do que em um bacharelado”, argumenta.

Segundo Danielle Filizola, coordenadora de Recursos Humanos da Quality Training RH, empresa especializada em recolocação profissional, em geral os professores de graduações tecnológicas são profissionais que estão inseridos no mercado de trabalho, e que levam a prática para a sala de aula. “Enquanto muitos professores do bacharelado seguiram a carreira acadêmica ou não estão mais no mercado de trabalho”, diz.

Stavros Xanthopoylos, vice-diretor do Instituto de Desenvolvimento Educacional da Fundação Getúlio Vargas (IDE/FGV), afirma que a maioria das graduações que não tecnológicas tem como fundamento ensinar o aluno o pensamento crítico e analítico. “O tecnólogo tem um perfil mais hands on (mão na massa)”, observa.

Não se trata de travar uma batalha entre a graduação em quatro anos e a tecnológica, em dois. Trata-se de apontar para o surgimento de novas possibilidades de formação, diferentes da tradicional, que têm transformado o perfil dos profissionais brasileiros em algo mais plural e que atende a diversos tipos de demanda do mercado de trabalho. “Quando os cursos em tecnologia surgiram, tinham como um dos propósitos atender alguns nichos de mercado emergentes que as carreiras mais tradicionais não contemplavam”, explica Eduardo Ehlers, diretor de graduação do Centro Universitário Senac.

Ele lembra que, em função de demandas regionais, muitas vezes é criado um curso de tecnologia mesmo não havendo um bacharelado na mesma área. “São cursos totalmente em sintonia com o mercado.” Segundo Eduardo, as áreas de Hotelaria, Produção Audiovisual, Jogos Digitais e Gastronomia são exemplos de carreiras que foram atendidas por cursos tecnológicos antes dos bacharelados.

Carreira focada

Nesse sentido, a formação de tecnólogos tem contribuído, de acordo com Eduardo, para a profissionalização de mercados emergentes, por um lado, e favorecido pessoas que gostariam de atuar em áreas específicas, mas que se viam presas na opção de cursar uma graduação abrangente de quatro anos sobre uma área mais ampla da que tinham como meta. Isso, para ele, contribui para o avanço mais rápido de determinados setores que trabalham em nichos, como o exemplo de Análise de Banco de Dados, em vez de um diploma em Tecnologia da Informação.

Assim, forma-se um profissional com conhecimento bastante específico para um mercado restrito a determinado tipo de demanda. Em outras palavras, o tecnólogo chega no mercado como um especialista em uma área focada, enquanto o bacharel chega como conhecedor da área como um todo, mas sem conhecimento específico de nichos. Para empresas que precisam de um profissional especializado em determinado segmento, pode valer mais a pena contratar um tecnólogo do que um bacharel, que precisaria ainda se familiarizar com o nicho.

Já o profissional, por outro lado, precisa ter em mente que uma formação específica lhe permite uma atuação específica, por isso seu campo de possibilidades profissionais é mais reduzido. “Se você está matriculado em um curso de Gestão de RH, vai trabalhar só com Gestão de RH. Se está em Gestão de Marketing, vai trabalhar só com Gestão de Marketing. Diferentemente do Bacharelado, em que formamos um generalista, a graduação tecnológica forma um especialista”, afirma Carlos Roberto Fernandes de Araujo, diretor nacional de ensino da Universidade Estácio de Sá.

Mudança de rumo

Outra vantagem intrínseca à graduação em tecnologia é a curta duração do curso.
O tecnólogo, conforme diz Stavros, tem a possibilidade de se capacitar rapidamente com algumas habilidades que lhe permitem atuar imediatamente no mercado. “Muitas pessoas com formação em tecnólogo saem dos nossos cursos para trabalhar em áreas como departamento comercial e recursos humanos, porque dominaram as áreas rapidamente no curso e, com isso, podem logo buscar um curso de pós-graduação”, afirma.

Essa rapidez com que um profissional pode se formar é um benefício, por um lado, porque pode representar em pouco tempo a progressão de carreira, seja ela de cargo e responsabilidade como salarial. José Roberto Marques, Master Coach Senior e Trainer do IBC Coaching (Instituto Brasileiro de Coaching), afirma que um curso tecnológico pode servir como uma “reciclagem” para o profissional que se sente estagnado na carreira ou tem a necessidade de expandir, de forma mais rápida, seus conhecimentos sobre determinado tema ligado a sua área de atuação. “É ainda uma forma de atualização sobre o mercado, suas mudanças, evoluções e uma maneira de aprimorar competências, desenvolver novas habilidades e também uma grande oportunidade de ter novos insights sobre a carreira, a profissão e novos campos de atuação”, analisa.

Por outro lado, uma formação tecnológica é também uma maneira prática de mudar o rumo da carreira sem precisar cursar quatro anos de uma graduação e ainda adquirir experiência em outra área, o que acarretaria em muito tempo para realizar uma transição. “Se você vai migrar para uma área totalmente diferente da sua, por exemplo sair de Marketing e ir para Alimentos, o curso tecnológico pode ajudar nessa transição”, diz Danielle.

O perfil do tecnólogo

Levando em consideração o quanto uma graduação tecnológica é focada, Danielle acredita que é interessante que o aluno desse curso já tenha uma experiência profissional anterior e que, portanto, saiba em que área específica deseja atuar. “Em geral são pessoas com um direcionamento na carreira que escolhem uma formação voltada para a área que já atuam”, diz. Danielle costuma aconselhar uma formação em tecnólogo para clientes com urgência em se colocar profissionalmente no mercado, ou ainda para quem sente falta de especialização na sua área.

Na FGV, a maior parte dos alunos desses cursos já está trabalhando e tem entre 35 e 37 anos, e já possui uma graduação. O mesmo acontece no Centro Universitário Senac. Eduardo justifica: “O profissional que já tem vivência do mercado sabe o que gosta de fazer. Muitas vezes, para o aluno recém saído do ensino médio, que não tem uma visão de um determinado segmento de mercado, é difícil já optar por um curso com um enfoque muito específico. Num bacharelado ele vai conhecer a área de conhecimento mais abrangente”.

Valorização

Outra questão que muitas vezes impede um aluno de fazer uma graduação tecnológica é o medo de seu diploma ser pouco valorizado no mercado. Por um lado, Letícia observa que nunca enfrentou preconceito na agência em que trabalha por causa de sua formação. Danielle também acredita que hoje essa graduação já é valorizada no mercado brasileiro.

Por outro lado, José Roberto, do IBC Coaching, reconhece que a valorização desse diploma aumentou consideravelmente, mas “ainda existe grande desconhecimento por parte dos contratantes sobre as competências dos profissionais que optam por este tipo de graduação”. Segundo ele, muitos ainda acham que o curso não é tão completo como uma formação convencional, quando na verdade apenas possui um enfoque diferente.

Mas esse preconceito está fadado a acabar, especialmente se a tendência prosseguir e mais e mais profissionais qualificados procurem esse tipo de formação. É o que defende Stavros, da FGV. Para ele, é apenas uma questão de tempo para que entendam que a qualificação dos tecnólogos é tão boa quanto a de outras graduações. “Ainda não caiu a ficha em algumas pessoas que precisamos avaliar os profissionais pelo que sabem executar”, afirma.

Essa mudança de mentalidade é prevista também por Eduardo, do Senac. Ele lembra que uma grande parte dos profissionais formados nos Estados Unidos e Europa são tecnólogos, e que essa tendência é inevitável no Brasil. “Esses cursos irão crescer muito na próxima década, porque o nosso mercado está em plena ebulição e isso demanda profissionais com conhecimento específico”, diz.


Busca por orientação

Antes de optar por uma graduação tecnológica, é importante tirar todas as dúvidas e obter orientação para a escolha do curso, já que ele possibilita uma atuação bastante focada. José Roberto Marques, do IBC Coaching, aconselha a busca do máximo de informações possíveis a respeito do curso que a pessoa deseja fazer. “Neste sentido, é importante buscar responder as seguintes questões, como por exemplo: Por que eu quero de fazer o curso X? Qual o mercado de trabalho? Quais instituições oferecem este curso? São reconhecidas pela MEC? Quanto ganha o profissional? Quais os campos de atuação? Desejo unir esta formação à minha carreira atual? Quero mudar de carreira? Será que um curso tecnológico atende realmente as minhas necessidades?”, ensina. Outra opção é pedir aconselhamento na própria universidade. A Estácio de Sá, por exemplo, possui um serviço de coaching para seus alunos. “A ideia do coaching é explicar para o estudante o que é um curso de graduação tecnológica. Como as pessoas têm muitas dúvida, fazemos essa orientação”, afirma Carlos Roberto Fernandes de Araujo, diretor nacional de ensino.